Possibilidade do poder executivo usufruir da sobra do limite de gastos com pessoal do poder legislativo.

Josenaldo Cerqueira Frota (*)

Fev. 2014

Recentemente, em discussão numa reunião de Prefeitos, na sede da Associação dos Municípios Piauienses – APPM, alguns profissionais levantaram a possibilidade do Poder Executivo usufruir da sobra do limite global do art. 19 da Lei Complementar nº 101/2000, de gastos com pessoal do Poder Legislativo; ou seja, fixando o limite daquele Poder em menos que 6% (seis por cento), e, automaticamente, o seu limite – do Executivo – sendo acrescido desta diferença, de forma que os dois não ultrapassem aos 60% (sessenta por cento) estabelecidos no citado art. 19.

Ainda nesta discussão, esses mesmos profissionais argumentaram que a determinação de tais limites de despesas com pessoal poderia se dar nas respectivas Leis de Diretrizes Orçamentárias.

Em minha opinião, isto não é possível, pois é vedado pela própria Lei Complementar nº 101, que em seu art. 20, a seguir transcrito com grifos nossos, assim dispõe:

Art. 20. A repartição dos limites globais do art. 19 não poderá exceder os seguintes percentuais:

I – na esfera federal:

        a) 2,5% (dois inteiros e cinco décimos por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas da União;

        b) 6% (seis por cento) para o Judiciário;

        c) 40,9% (quarenta inteiros e nove décimos por cento) para o Executivo, destacando-se 3% (três por cento) para as despesas com pessoal decorrentes do que dispõem os incisos XIII e XIV do art. 21 da Constituição e o art. 31 da Emenda Constitucional no 19, repartidos de forma proporcional à média das despesas relativas a cada um destes dispositivos, em percentual da receita corrente líquida, verificadas nos três exercícios financeiros imediatamente anteriores ao da publicação desta Lei Complementar;

        d) 0,6% (seis décimos por cento) para o Ministério Público da União;

        II – na esfera estadual:

        a) 3% (três por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Estado;

        b) 6% (seis por cento) para o Judiciário;

        c) 49% (quarenta e nove por cento) para o Executivo;

        d) 2% (dois por cento) para o Ministério Público dos Estados;

        III – na esfera municipal:

        a) 6% (seis por cento) para o Legislativo, incluído o Tribunal de Contas do Município, quando houver;

        b) 54% (cinqüenta e quatro por cento) para o Executivo.

O argumento utilizado para a recomendação de serem estabelecidos limites diferentes daqueles determinados pela Lei Complementar nº 101, foi justamente com base nas disposições contidas no § 5º, do mesmo art. 20 de referida lei, que aqui se transcreve:

Art. 20. (,,,)

(…)

§ 5o Para os fins previstos no art. 168 da Constituição, a entrega dos recursos financeiros correspondentes à despesa total com pessoal por Poder e órgão será a resultante da aplicação dos percentuais definidos neste artigo, ou aqueles fixados na lei de diretrizes orçamentárias.

Ora, quais são os fins do art. 168 da Constituição Federal? Vamos relembrar transcrevendo o artigo citado.

Art. 168. Os recursos correspondentes às dotações orçamentárias, compreendidos os créditos suplementares e especiais, destinados aos órgãos dos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública, ser-lhes-ão entregues até o dia 20 de cada mês, em duodécimos, na forma da lei complementar a que se refere o art. 165, § 9º. Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Para que não seja perdida nossa linha de raciocínio, interessante que também aqui seja transcrita as disposições contidas no caput do art. 19 da Lei Complementar nº 101, de 2000; que, aliás, é o cerne dessa acalorada discussão:

Art. 19. Para os fins do disposto no caput do art. 169 da Constituição, a despesa total com pessoal, em cada período de apuração e em cada ente da Federação, não poderá exceder os percentuais da receita corrente líquida, a seguir discriminados:

E, para continuidade de nossa linha de raciocínio, imperiosa a transcrição do contido no caput do art. 169, da Constituição Federal:

Art. 169. A despesa com pessoal ativo e inativo da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios não poderá exceder os limites estabelecidos em lei complementar. (Redação dada pela pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)

Portanto, diante das disposições constitucionais e legais acima transcritas, se deduz que a finalidade prevista pelo legislador pátrio, quanto às disposições do art. 168 da Constituição Federal, tão somente, é a de se estabelecer a data limite para os repasses dos duodécimos destinados aos Poderes Legislativo e Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública.

E, retornando às disposições do § 5º do art. 20 da Lei Complementar nº 101, em sua última parte, “… ou aqueles fixados na lei de diretrizes orçamentárias” não significa que se pode desobedecer o disposto no caput do mesmo art. 20, acima transcrito, e com nosso grifo, “não poderá exceder”.

Assim, os limites que poderão ser fixados nas leis de diretrizes orçamentárias deverão guardar consonância com aqueles determinados pela Lei Complementar nº 101, de 2000; ou seja, poderão ser fixados até os limites por ela estabelecidos para cada esfera de governo e por Poder. Poderão eles ser fixados em percentuais inferiores aos limites máximos estabelecidos. Porém, jamais ultrapassando os limites individuais máximos (repartição dos limites globais) a que se refere o caput do art. 20 da mesma Lei Complementar nº 101, de 2000.

Daí se podendo concluir que inexiste qualquer possibilidade de que venha um Poder a estabelecer percentuais menores para que, única e exclusivamente, um possa beneficiar-se ou usufruir da sobra do outro. Existe sim, a possibilidade de se estabelecer percentuais menores ou diferentes dos fixados para cada Poder.

Finalizando, e para não sermos intitulados como “donos da verdade”, vale dizer que a discussão continua em aberto…

 (*) Contador, Técnico em Contabilidade, empresário contábil dedicado à contabilidade governamental.

(**) Revisado pelo Dr. Cláudio Roberto Loureiro, Consultor Especialista em Administração Pública.